Morto há uma década, Michael Jackson ainda lucra com seu legado

27.06.2019 | 16h02 - Atualizada em: 28.06.2019 | 05h55
Por Marina Martini Lopes
Editora
Cantor Michael Jackson se apresentando ao vivo

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Mundo Itapema

Rei do pop chega à era #MeToo com uma obra influente o suficiente para blindar a imagem arranhada

No ano passado, Drake lançou uma música com Michael Jackson. “Don’t Matter To Me”, com vocais inéditos gravados em 1983, não é exatamente uma novidade – Michael já teve álbuns póstumos lançados –, mas chama atenção que o artista que mais discos vendeu no ano passado esteja recorrendo ao arquivo de alguém que morreu há dez anos, exatamente no dia 25 de junho de 2009.

Foto: Divulgação

Em março, estreou na HBO o documentário “Deixando Neverland”, com novas denúncias de pedofilia contra Michael. Numa decisão bastante representativa do que se tornou a relação com o legado do rei do pop, Drake aderiu aos chamados de boicote da internet e parou de tocar a música, enquanto ela segue acumulando milhões de plays no streaming. Essa situação de sucesso de público e linchamento moral é o que o espólio de Michael tem passado na primeira década após a morte do astro. O cantor deixou uma dívida em torno de US$ 500 milhões. Ao fim de 2016, os administradores dos negócios do artista já haviam arrecadado mais de US$ 1,3 bilhão.

“Ele ganhar muito dinheiro depois de morto tem a ver com o que fez em vida, como comprar parte do catálogo dos Beatles”, diz Zack Greenburg, editor da revista americana Forbes. Nos últimos anos, Michael tem dominado a lista de celebridades mortas que mais lucram, segundo a publicação. Greenburg também cita as negociações com o espólio do artista, que inclui a venda da fatia de Michael do catálogo dos Beatles, um novo acordo com a Sony e parcerias com o Cirque du Soleil.

Além disso, o documentário “This Is It” (2009) arrecadou mais de US$ 260 milhões. Os dois álbuns póstumos, “Michael” (2010) e “Xscape” (2014), mesmo sem um desempenho espetacular, renderam pelo menos um grande hit: “Love Never Felt So Good”, com Justin Timberlake. “Michael continua gerando apelo equiparável ao nível de consumo que ele tinha antes”, afirma Greenburg. Nos cinco anos posteriores à sua morte, ele vendeu mais de 13 milhões de discos, contra menos de 4 milhões nos cinco anos anteriores.

A maior batalha do espólio de Michael tem sido nos tribunais. Mesmo inocentado, em 2005, das acusações de abuso infantil, a imagem do astro vem sendo manchada desde a década de 1990. Uma das pessoas que resolveram falar sobre o passado com Michael foi Xuxa. Ela disse ter sido “convidada” para ser mãe de filhos do cantor. Ele queria alguém “saudável” e que “gostasse de criança”.

“Deixando Neverland” representa o choque da era #MeToo com um dos artistas fundamentais do século 20. Suas quatro horas de narrativa apresentam relatos perturbadoramente ricos - com descrições dos supostos encontros sexuais -, tudo baseado só nos depoimentos de seus acusadores. Não há ali documentos ou outras evidências. O diretor, Dan Reed, aposta na versão das supostas vítimas - Wade Robson, James Safechuck e seus familiares - e imagens de arquivo misturadas com cenas ilustrativas do famoso rancho Neverland.

Chocante o suficiente para causar indignação, “Deixando Neverland”, contudo, reforçou a polarização. A família de Michael já processa a HBO, exigindo US$ 100 milhões, e os fãs refutam as histórias, apontando incoerências no filme. Em março, brasileiros foram à Paulista em defesa do ídolo. Com a apresentadora Oprah Winfrey contra e o ator Macaulay Culkin a favor, Janet Jackson, uma das irmãs de Michael, rompeu o silêncio depois da estreia de “Deixando Neverland”. “Seu legado vai continuar”, ela disse.

Se algumas rádios pararam de tocar músicas do astro e as redes sociais ainda são hostis para seus defensores, o boicote, em geral, não teve grande efeito. Logo após a exibição do filme na HBO, aumentaram as vendas de álbuns e os acessos de Michael no streaming. No centro do debate, está uma das questões fundamentais da atualidade: é possível separar a obra do artista? É como se Michael - uma entidade quase não humana - já estivesse tão incrustado na nossa cultura que talvez seja impossível apagar sua imagem. A sensação, na verdade, é a de que, se não for cancelado pela internet, Michael Jackson vai se tornar uma figura ainda mais mitológica, para o bem e para o mal. O editor da Forbes diz que, “apesar das controvérsias, ele seguirá entre as celebridades que mais faturam - neste mundo ou no próximo”.

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