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O espetáculo do Talking Heads marcou a televisão nos anos 1980
"Stop Making Sense" é o espetáculo dos Talking Heads em que David Byrne vestiu aquele enorme terno cinza, com ombreiras de um metro, fazendo com que sua cabeça ficasse pequenininha quando vista da plateia. O clipe de "Girlfriend Is Better", tirado desse show, passou tanto na televisão nos anos 1980 que a imagem do terno gigante se tornou um ícone para a banda e seus fãs.
A imagem de Byrne com o terno foi usada no pôster desse filme de Jonathan Demme e na capa do disco homônimo, que serviu de trilha sonora, ambos lançados em 1984. É curioso se dar conta hoje que, no show original, Byrne só usa a estranha vestimenta em três canções. Seja como for, com ou sem terno gigante, a apresentação toda é fenomenal. Lançado comercialmente nos cinemas dos Estados Unidos, ganharia prêmios e presença certa em todas as listas de melhores filmes de rock de todos os tempos. E "Stop Making Sense", ou pare de fazer sentido, em inglês, é um título que se tornou atual nesses meses em que somos obrigados a viver de forma tão diferente do usual.
Jonathan Demme ainda não era o famoso cineasta que ganharia o Oscar nas cinco principais categorias por "O Silêncio dos Inocentes", de 1991. Mas já era um veterano do cinema, com meia dúzia de longas lançados e uma série de clipes musicais no currículo. Para compor o longa, de 88 minutos, Demme filmou quatro apresentações dos Talking Heads, em Los Angeles, em dezembro de 1983.
O formato é inovador. A primeira coisa que se vê é um palco mal-ajambrado, com escadas e uma parede mal pintada. David Byrne entra sozinho com um violão e um aparelho de fita cassete. Começa aí "Psycho Killer", do primeiro disco da banda, de 1977. Na música seguinte, a baixista Tina Weymouth se junta a ele e tocam a delicada "Heaven". Para a próxima, os roadies empurram uma plataforma com a bateria montada em cima, e aparece Chris Frantz com suas baquetas. A quarta música vê a chegada do quarto membro dos Talking Heads, o guitarrista e tecladista Jerry Harrison.
Nas três canções seguintes, duas vocalistas, um guitarrista, um percussionista e um tecladista, se unem à banda. É o auge do show, com "Slippery People", "Burning Down the House" e "Life During Wartime". Todos vestidos de tom cinza, o que contrasta com o clima da banda, contente por estar ali fazendo música. Qualquer um que goste de rock, mesmo não sendo fã dos Talking Heads, vai tirar o chapéu para essa parte inicial de sete músicas. Sobre as letras, é importante que a versão que está no ar pelo Belas Artes À La Carte tem o cuidado de trazer legendas para todas as canções, algo raro no caso de shows filmados, mas muito bem-vindo.
Uma segunda parte, com mais cinco músicas e músicos renovados com uma troca de guarda-roupa, desemboca na excelente "Once in a Lifetime". Em seguida, acontece um curioso parênteses. Em 1981, a baixista Tina e o baterista Chris, casados, criaram uma banda paralela, a Tom Tom Club, e lançaram um álbum de enorme sucesso nos Estados Unidos. Sua excelente canção "Genius of Love" , com um inconfundível e irresistível riff ardido de guitarra, deve ter tocado em todas as pistas de dança do mundo naquela primeira metade dos anos 1980 – atingindo, talvez, mais sucesso do que qualquer outra do Talking Heads até então.
Pois é justamente essa música que Weymouth canta nesse breve hiato do show, em que Byrne deixa o palco e o entrega ao Tom Tom Club. A plateia de Los Angeles responde com empolgação, abrindo caminho para a terceira e última parte da apresentação. É quando entra Byrne com seu terno gigantesco e canta as três finais. Com menos de uma hora e meia, "Stop Making Sense" é uma live de 1983 transmitida diretamente para sua televisão ou computador 36 anos depois de ter acontecido. Ou parou de fazer sentido?
*por Ivan Finotti